“Não
há derrota definitiva,
O
momento que vivemos demanda reflexão e diálogo, dentro e (principalmente) fora
das bolhas que vivemos. Demanda pensar o ontem, o hoje e o amanhã. Demanda
saber nossos riscos e potencialidades. Demanda não fechar nossas posições como
certas e definitivas. Demanda “baixar o muro” e ouvir o outro. Demanda debater e
construir o novo que queremos.
Enquanto alguns chegaram para zombar e/ou "passar na cara" a vitória, eu optei por não aceitar provocação e antecipar algumas linhas, cinco laudas na verdade, sobre o que entendo como
tarefas iniciais, coletivas e imediatas; sobre algumas incertezas e/ou
condicionantes para um futuro próximo. Pois lá na frente, quando alguns elementos começarem a se concretizar, não chegarei com um simplório "eu disse", ao contrário, direi que é hora de respeito e trabalho coletivo.
Sintetizei
aqui sobre a Virada Programática em disputa mais intensa desde 2016; a nova Câmara
dos Deputados e o peso do Campo Popular na institucionalidade e nas ruas; sobre
qual Bolsonaro teremos, se o do 1º turno, o do 2º turno ou o presidente das
declarações do dia da vitória, pois entendo que daí sairá as principais
consequências desses depois, de qual Brasil teremos e queremos; e reflito nas
últimas linhas sobre segurança e resistência, pois nossa defesa é nosso grito,
jamais nosso silêncio.
Sim, Virada, Virada Programática!
Explicarei.
A
postura programática iniciada no desgoverno Temer, com algumas medidas
aprovadas com o voto de Bolsonaro e outros Deputados Federais, a exemplo da
Reforma Trabalhista e da Emenda Constitucional 95, não teve sequência devido a
reação popular (e aproximação das eleições) que conseguiu impedir a aprovação
da Reformada Previdência e outros medidas que viriam na sequência. Agora o
Programa de Governo eleito nas urnas acelera o Programa que Temer tentou impor
e não conseguiu. Quem votou para derrotar o PT, ganhou a derrota do PT e, de
brinde, o Programa de Governo registrado no TRE.
O
próprio Temer já deu sinal verde para Bolsonaro, este dizendo sim, o primeiro
vai por em pauta no Congresso Nacional, ainda nessa legislatura, a Reforma da
Previdência, sim a que conhecemos.
O
Programa de Temer, que não tinha voto e legitimidade, agora vai tentar ser
imposto pelo Presidente Eleito, já que se trata de um Programa inscrito na
Justiça Eleitoral e vitorioso nas urnas (Não vou entrar em debate de Caixa 02
ou Fake News).
A
Proposta de Brasil em disputa intensificada em 2016, que teve uma vitória
parcial com Temer, sai fortalecida nas urnas agora em 2018 (por mais que muitas/os
não tenham lido esse Programa). A prometida Redução do Estado vai recair
diretamente sobre aposentadorias, patrimônio público (Correios, Petrobrás,
Banco do Brasil, Amazônia, Eletrobras e outro), direitos sociais, servidor/a e serviço público.
A
questão é, nem sempre quem ganha leva! Vivemos uma democracia (ao menos por
enquanto) com Presidente e Congresso Nacional. Boa parte do que consta no
Programa de Bolsonaro depende de Emenda Constitucional, que precisa do voto de
308 Deputados Federais dos 513 que tomarão posse em 2019 e de amplo apoio
popular.
A “Nova” Câmara dos/as Deputados/as
O
Povo Mostrou que quer renovação. Mais da metade dos/as Deputados/as perderam
seus mandatos. O PSDB e o PMDB, agentes diretos do golpe de 2016 e da aprovação
das medidas de Temer, tiveram a uma derrota da história, o primeiro perdeu 25
Deputados, o segundo 32. O PT, com toda luta midiática pelo antipetismo, segue
sendo a maior bancada com 56 Deputados; o PSOL dobrou a bancada eleita, agora
tem 10 Federais; o PDT com 28 (9 a mais); PSB com 32; PCdoB com 09; e PPL com
01; isso sem contar outros partidos e suas divisões (foram eleitos Deputados de
30 partidos); e a forma como o Parlamento irá olhar a nova disposição do povo
em renovar o Congresso.
Tendo a acreditar que será
mais difícil para Bolsonaro aprovar Emenda Constitucional do que foi para
Temer. Isso é bom para Democracia e para os direitos ainda garantidos na
Constituição de 1988.
O
PSL, partido de Bolsonaro, apesar de ser (a preço de hoje) a segunda bancada na
Câmara dos Deputados, com 52 Deputados Federais (entre eles Alexandre Frota, o
Príncipe Luiz Philippe O. Bragança e mais de dezena entre militares e delegados),
teve essa bancada eleita com uma unidade programática que não vai além da pauta
conservadora de ultradireita conservadora nos costumes. Esta pauta (em sua
maioria) para ser aprovada precisará de Emenda Constitucional ou de longo
debate sobre as cláusulas pétreas (Aborto Legal, Redução da Maioridade Penal,
Função Social da Propriedade, Pena de Morte). Tendo a acreditar que a
fragilidade dessa bancada não irá ajudar tanto na condução do novo governo, mas
é dela, e da postura que venha a ter o Bolsonaro, que nossa Democracia pode ser
posta em risco.
Qual Bolsonaro Teremos?
Arriscado
avançar em um tema como esse poucos dias após as eleições, mais arriscado ainda
quando não fazemos uma boa revisão bibliográfica, mas vou seguir. No discurso
pós-vitória, para quem acompanhou as declarações de antes e durante o processo
eleitoral, o Bolsonaro foi cuidadoso no trato d@s opositores/as e das
liberdades individuais, imagino que isso tenha relação com a expectativa de
governabilidade.
Nossa
legislação não mudou e não é simples por em prática as declarações de ódio e
antidemocráticas feitas pelo Presidente eleito no 1º e no 2º Turno. As declarações pós-vitória, se mantendo,
aliviará as tensões existentes no país no que diz respeito as liberdades
individuais e democráticas. Aqui temos apenas incertezas, tudo depende da
postura do Bolsonaro na disputa por implementar seu Programa de Governo, de
forma propositiva e disputa institucional ou com declarações de ódio transmitidas
para as ruas.
Vimos
diversos casos de violência, segundo os próprios agressores, instigados pelas
declarações de Bolsonaro. Para seguir a
violência e perseguição a opositores não precisa de mudança de legislação,
a postura de uma liderança pode incendiar o país e ainda tentar tirar o corpo
fora ao dizer que não pode ser responsabilizado pelos atos dos outros (como
disse Bolsonaro em outras oportunidades). Mas agora, no cargo que ocupará, em meio a tantas
diferenças no Congresso, as pendências do processo eleitoral, e ao Vice que tem
Bolsonaro, ele precisará ter mais cuidado para garantir a tão falada
governabilidade.
Em
outras palavras, não temos ideia até onde vai o Bolsonaro ao perceber que suas
propostas contra o povo não serão aprovadas com facilidade. E não será “apenas” pelo peso da nova Câmara dos Deputados ou pela divisão que seguem em
nosso país (Haddad teve mais de 47 milhões de votos; PT, PSB, PDT e PCdoB somam
09 governadores/as; 100% dos estados do Nordeste disseram não ao Projeto
Bolsonaro - sendo todas as cidades do Ceará, Piauí e Sergipe). Soma-se a tudo
isso o fato de mais de 42 milhões de pessoas que não foram votar, votaram branco e
votaram nulo, estes, ao lado dos votos no Haddad, totalizaram mais de 90 milhões de brasileiros/as
que disseram não ao Programa defendido por Bolsonaro.
Lembremos
ainda que o debate sobre o desmascaramento de alguns Fake News teve impacto social, reduzindo certos compartilhamentos,
foi educativo e não terá mais o mesmo
impacto na sociedade (não estou dizendo que deixarão de existir). Essa
questão não é menor, pois eles (os Fake News) tiveram impacto no resultado
eleitoral, mas não darão base de sustentação para nenhum governo.
Vou
além, o que vai defender nossa democracia e nossos direitos é o que foi feito
no segundo turno, as milhões de pessoas que foram para as ruas em todo Brasil.
Uma mobilização bem superior ao que foi feito por Bolsonaro na campanha e na
comemoração da vitória, aqui não falo em votos (claro), mas das ruas como
espaço democrático da luta por direitos.
Nós,
povo, fizemos bonito, não foi o PT, não foi o PSOL, não foi um partido, mas a
unidade dos/as lutadores/as sociais, a unidade do povo, de muitos que há tempos
não ia para atos, de muitos que nunca foram para atos. A unidade coletiva por
direitos é, também, a luta contra o fascismo.
Ódio ou Democracia, que Brasil
Queremos/Teremos?
Na
quinta-feira (25 de outubro) ouvi a seguinte frase: “Segunda eles vão ver o que
é bom!”. Isso pode significar muita coisa, inclusive os casos de violência
contra mulheres e LGBTs que ocorreram no pós-resultado, um desses casos aqui na
Paraíba na noite de 29 de outubro de 2018. Contudo, longe do quadro que alguns
esperavam para os primeiros dias pós-eleição. Cuidado, atenção e organização
coletiva é o que precisamos no momento. O medo deve ser sinal de alerta, não de
paralisia.
Lembremos
que segunda-feira chegou e nossa legislação é a mesma, quem espanca é agressor
e deverá ser preso, da mesma forma quem estupra e mata, seja civil, seja
militar. Claro, o estrago Bolsonaro já fez com suas declarações encorajando o
ódio e o preconceito guardado no peito de muitos, vai demorar a reestabelecer
uma “normalidade” (que, como sabemos, já era impactante).
Os
homens brancos, héteros e vermelhos, em especial os que andam em grupos de amigos, ainda
não sentiram na pela a violência em curso, a covardia desses agressores é
seletiva, é baseada especialmente no machismo, na LGBTfobia e no racismo. Os
agressores são covardes, medrosos de encarar o um a um.
As
declarações de Bolsonaro na vitória
podem frear esse processo, ele falou da democracia, das liberdades individuais
e do respeito a constituição, apresentando a intenção de construir algumas
Emendas Constitucionais.
Em
outras palavras, respeitar a legislação de hoje e, consequentemente, a punição
de agressores e corruptos (a exemplo de Temer que em breve, pela lei, poderá
ser preso) de hoje e do amanhã, é central para democracia. Ninguém tem carta
branca para agredir diferenças de gênero, orientação sexual, raça ou
ideológica.
Tentar
mudar a legislação, desde que respeite as cláusulas pétreas, é democrático,
desde que respeitando também a vontade popular, a participação popular e o parlamento.
Penso
que só assim, respeitando a legislação e não instigando o ódio, será possível
um governo de Bolsonaro; do contrário, serão anos de instabilidade e caos em
nosso Brasil, que não é governado pelo PT desde abril de 2016.
Fortalecer nossa Resistência é
Garantir nossa Segurança
Lembremos
que só ampliamos no segundo turno quando mostramos nossa cara, quando colamos
nossos adesivos, quando vestimos nossas camisas, quando ocupamos as ruas,
quando fomos para os bairros bater porta a porta.
Verdade
que os crimes de ódio contra negros, LGBTs e mulheres, não foram inventados por
Bolsonaro; mas também é verdade que as declarações anteriores a vitória
ajudaram a encorajar alguns covardes que agem na escuridão ou na vantagem
numérica.
Nas
reuniões do PSOL, desde o primeiro turno, eu tenho dito: o ódio e o preconceito
que fiquem no armário. Vamos mostrar nossa posição política. Vamos agir sobre a
lei que temos. Vamos andar em grupo. Vamos denunciar toda e qualquer agressão.
Vamos usar da legítima defesa quando for possível. Vamos correr e denunciar
quando for necessário. Vamos sempre contactar advogados/as populares para
evitar ambientes hostis e garantir o devido processo legal. Vamos mapear locais
de agressão e registrar as caraterísticas dos agressores para que sejam
punidos.
Nossa
defesa é nossa organização coletiva em partidos, movimentos, grupos
antifascistas, grupos de amigos/as. Nossa
defesa é nosso grito, jamais o silêncio.
Voltando ao Início, Lutar Por
Direitos é Lutar Contra o Fascismo!
Caso
Bolsonaro queira governar, ele terá que respeitar a lei e as diferenças, do
contrário as feridas do processo eleitoral, os mais de 80 milhões que não votaram
em Bolsonaro, os 30 partidos representados no Congresso Nacional e a força das
ruas, buscarão restabelecer a Ordem e o Progresso, afinal de contas, foi a
bandeira que ganhou as eleições. Agora é a disputa sobre qual Ordem e qual
Progresso, se para o mercado ou para as cidades, se para o poder econômico ou
para o povo.
Existe
grande possibilidade de que Bolsonaro não tenha força para impor o Programa
Eleito, para isso ele precisará recuar na postura autoritária e debater
institucionalmente. Diante disso existe grande possibilidade de Temer, com o
apoio de Bolsonaro, antecipar a aprovação da deReforma da Previdência. Será a
primeira tarefa da resistência democrática, defender nossa aposentadoria, agora
com a força da mobilização que demostramos no segundo turno.
No
segundo turno ficou claro que as mobilizações não foram e não são de um
partido, mas de uma ideia coletiva de democracia e justiça social que faz
intercessões as mais diversas com indivíduos, movimentos, partidos, povos
tradicionais e originários. É hora de baixar muro, evitar hegemonismos e construir
sínteses.
Não
é da boca para fora, não são nossas palavras de ordem, não são nossas crenças, a questão
é objetiva, Lutar por Direitos é Lutar Contra o Fascismo. A história não
acabou, a luta não acabou, não ganhamos, mas não perdemos!
João Pessoa, 30
de outubro de 2018.
Tárcio Teixeira
Presidente do PSOL/PB
Militante Verde, Amarelo e Vermelho do Pau Brasil